
Tinha ouvido e lido por aí opiniões não-favoráveis a Última Parada 174. Um típico comentário negativo era o assalto ao tal ônibus se resumir a uma pequena cena do filme - e ainda ser guardada para os últimos minutos da projeção. De fato é o que acontece - apesar de ter durado mais do que eu imaginava. Mas, não fato, apenas impressão pessoal, era o melhor a se fazer.
Quando fiquei sabendo que Bruno Barreto iria dirigir um filme [ponto negativo 1] ficcional sobre a história do Sandro do Nascimento [ponto negativo 2] e seria refilmado o episódio do ônibus 174 [ponto negativo 3] torci o nariz. Imaginei que o filme se proporia a ser uma mera transposição daquele assalto verídico, visto por todos inúmeras vezes, a uma encenação que, por mais próxima aos acontecimentos reais, não atingiria o público como fazem as imagens reais. Eu não via o menor sentido nessa proposta, nessa recriação e, ufa, não é essa a proposta do filme. No fim das contas, acho o tempo que o assalto ao ônibus ocupa na tela ideal e o modo de realização da cena eficiente.
E até chegar ao gran finale, Última Parada 174 mostra uma história bem construída repleta de licença poética, inserindo personagens fictícios em meio a trajetória de Sandro, colocado no papel de vítima da desigualdade social, da falta de família, da criminalidade, da falta de incentivo e apoio, de um sistema de recuperação deficiente e o que mais você quiser. E isso é óbvio [nem precisava um personagem do filme dizer em certo momento, como inutilmente ocorreu], mas ainda há o direito de escolha de Sandro e nada o que sofreu é justificativa para o que protagonizou. Quando há oportunidades de mudanças, não são nelas que ele se refugia. Mas esperar que tome com facilidade uma atitude diferente a esta é muito fácil para quem está do outro lado, como eu e você.
Contendo essas questões sociais que você já viu retratadas em outros longas brasileiros de mesmo aspecto, o filme se mantém interessante ao articular os personagens e desenvolver de forma positiva o envolvimento entre eles - até pensei em certo momento durante a sessão que o filme funcionaria bem independente de tentar mostras fatos reais, devido a trama bem construída que o roteiro oferece. Bruno Barreto me surpreendeu positivamente [seus últimos filmes fiz questão de manter distância] apesar de alguns descuidos que comete, como por exemplo na primeira cena de sexo de Sandro e Soninha, envolvida por uma trilha sonora totalmente desconexa com as imagens vistas e um zoom esquisito demais num cobertor que ocupa toda a tela mais tempo do que deveria. Não posso deixar de citar também um ônibus super-moderno [curiosamente é da empresa Amigos Unidos, a mesma da linda 174 - e a mesma que pego todos os dias para ir a faculdade, mas isso é um mero detalhe] que passa próximo à Candelária em pleno ano de 1983.
Última Parada 174 me trouxe à tona novamente a realidade a qual estou inserido [não que eu consiga dela me abster por muito tempo] e pareceu-me bem melhor do que imaginava. Mas mesmo para mim que não assisti o documentário de José Padilha - o que pretendo corrigir o mais breve possível - o filme soa esquecível e pequeno se comparado a produções brazucas de mesmo teor. E quanto ao Oscar, mais uma vez o Brasil está longe de ganhar um.